Conjunto de proteção, manobra e comando – Parte 02/03

Essa é a segunda parte do artigo: Conjunto de proteção, manobra e comando – Parte 01/03

 

2) Dimensionamento do quadro de distribuição

O correto dimensionamento do quadro de distribuição é fundamental para o bom funcionamento da instalação como um todo. Para os quadros de distribuição terminais (aqueles que alimentam diretamente as cargas) o principal aspecto a ser observado é, sem dúvida, a quantidade de circuitos. E esta quantidade é resultado da análise preliminar do projetista e do planejamento e divisão da instalação. Não se deve esquecer, nessa etapa, do espaço reservado para o dispositivo de seccionamento/interrupção principal, dispositivo DR, DPSs, dentre outros possíveis. Já para os quadros de distribuição propriamente ditos, normalmente de dimensões maiores que os anteriormente descritos, além desses aspectos, torna-se também importante a análise do espaço para acomodação de condutores (cabos ou barramentos) e espaçamento extra entre dispositivos de proteção para permitir uma boa circulação de ar no interior do quadro, evitando assim a elevação da temperatura interna. Isso é bastante importante considerando-se que o ajuste das proteções (por exemplo, a corrente nominal dos disjuntores) é altamente dependente da temperatura do dispositivo.

 

ESPAÇO RESERVA (de espaço físico e de carga)

Um ponto em comum para os dois tipos de quadro é a sua capacidade reserva para futuras ampliações. O artigo 6.5.4.7 da NBR 5410 exige que todo quadro de distribuição possua um espaço reserva para acomodar novos circuitos não previstos no projeto inicial. A quantidade de espaço reserva é indicada na Tabela 59 da NBR 5410 e reproduzida na Tabela 1 abaixo:

A primeira dúvida que surge ao se observar a Tabela 1 acima é que a norma NBR5410 não explicita o número de fases que cada espaço reserva deve conter, ou seja, não diz se o dispositivo de proteção de cada circuito reserva deve ter um, dois ou três polos. Cabe, neste caso, o bom senso do projetista. Uma boa prática seria escolher dispositivos de proteção para o espaço reserva com o mesmo número de polos dos dispositivos de proteção dos circuitos efetivos do quadro de distribuição. Por exemplo, se o quadro possui circuitos monofásicos e bifásicos, o espaço reserva deve prever a instalação de dispositivos de proteção monopolares e bipolares. Ou se o quadro possui circuitos bifásicos e trifásicos, o espaço reserva deve prever a instalação de dispositivos de proteção bipolares e tripolares.

Por outro lado, a norma é muita clara a respeito do dimensionamento do alimentador do quadro de distribuição na nota da Tabela 59 da NBR 5410, que diz: A capacidade reserva deve ser considerada no cálculo do alimentador do respectivo quadro de distribuição. Apesar de parecer óbvio, é muito comum encontrar circuitos alimentadores de quadros de distribuição dimensionados sem reserva de carga. Se isto não for atendido, como alguém poderia adicionar novos circuitos ao quadro de distribuição se o seu alimentador não suportar este aumento de carga? Portanto, no cálculo da corrente de projeto (Ib) do alimentador do quadro, deve-se levar em consideração a reserva de carga prevista para o mesmo.

 

3) Grau de proteção: Por que IP54?

O grau de proteção do invólucro dos quadros de distribuição é um tema que gera muita dúvida entre os projetistas de instalação elétricas. E a resposta para essa questão não é trivial, pois como já dito anteriormente, cada projeto é único e não existe uma solução pronta que atenda qualquer situação. Nesse sentido, é muito comum encontrar projetos de instalações elétricas cujos quadros de distribuição foram todos especificados com grau de proteção IP54, mesmo com os quadros instalados em ambientes completamente distintos. Mas qual seria a origem dessa tendência? Provavelmente a causa seja o desconhecimento, por parte do projetista, de um assunto extremamente importante na fase de projeto: a classificação das influências externas. Essa classificação é apresentada na seção 4.2.6 da NBR 5410 (sugiro o estudo detalhado dessa seção da norma) e deveria ser umas das etapas iniciais de qualquer projeto de instalações elétricas, apesar de ser muito negligenciada. Esse procedimento tem como objetivo principal fornecer subsídios para o projetista especificar e selecionar todos os componentes da instalação, desde linhas elétricas até os quadros de distribuição. E duas condições dessa classificação, que são a presença de água (código AD) e a presença de corpos sólidos (código AE), são as que determinam o grau de proteção IP (proteção contra penetração de corpos sólidos ou água) dos componentes.

A determinação do grau de proteção IP é assunto da norma NBR IEC 60529 [5]. Por meio dela é possível classificar um invólucro segundo sua capacidade de proteção contra penetração de água e corpos sólidos. A sigla que representa o grau de proteção inicia-se com o código IP seguido por 2 algarismos. O primeiro representa a proteção contra a penetração de corpos sólidos e o segundo contra a penetração de água. Hipoteticamente, para o caso dos quadros de distribuição, tem-se uma classificação que poderia ir desde IP00, sem proteção alguma contra penetração de corpos sólidos e água, até IP68, totalmente protegido contra penetração de corpos sólidos (entenda-se poeira) e para uso submerso. Como mencionado acima, esses são casos hipotéticos, sem muita aplicação prática.

No caso do IP68, é notório que não haveria um caso prático com este grau de proteção, no qual o quadro de distribuição poderia ser instalado em local totalmente submerso. Por outro lado, um quadro de distribuição com IP00 merece uma análise mais cuidadosa. Como seria implementado um quadro de distribuição com IP00, ou seja, sem invólucro nenhum? Na prática, a norma NBR5410 até permite situações como essa (ver Figura 1), porém são casos muito particulares que serão abordados em outros artigos. Isso leva a reflexão de qual seria o grau de proteção mínimo de um quadro de distribuição. E a resposta para essa questão é dada pela própria NBR 5410 de forma indireta em mais de um local no texto.

 


Figura 3 – Quadro de distribuição que pode ser classificado com IP00 (sem proteção contra penetração de corpos sólidos ou água). Pode-se observar os barramentos de cobre totalmente acessíveis. Nessa situação em particular, o quadro de distribuição está localizado em um ambiente acessível apenas à eletricistas, técnicos e engenheiros. Este quadro não deve ser considerado como exemplo de fabricação/montagem correta ou incorreta. Foi utilizado apenas para exemplificar o grau de proteção IP00. Fonte: acervo do autor.

 

Primeiramente, a NBR5410, em seu artigo 5.1.1.1 – Princípio Fundamental traz o seguinte:

“O princípio que fundamenta as medidas de proteção contra
choques especificadas nesta Norma pode ser assim resumido:
– partes vivas perigosas não devem ser acessíveis (…)”

 

Se a norma determina que “partes vivas não devem ser acessíveis”, entende-se que essas partes vivas (condutores elétricos que podem ser percorridos pela corrente do circuito) devem ser acondicionadas em invólucros que impeçam o contato direto com elas. Portanto, seria conveniente selecionar o IP-2X, ou seja, protegido contra penetração de corpos sólidos com diâmetro de até 12mm (o “X” representa que o algarismo correspondente à água é indiferente para este invólucro, pois estamos considerando o quesito de acessibilidade das partes vivas). Este é o grau de proteção adequado considerando que uma pessoa não seria capaz de introduzir um dedo no interior do quadro de distribuição, tornando assim as partes vivas inacessíveis. Portanto, esse é o ponto de partida de qualquer componente da instalação: grau de proteção IP-2X.

Além disso, a norma é explicita em diversos trechos quando o assunto é o uso de barreiras ou invólucro para garantir a proteção contra choques. O grau de proteção IP mínimo deve ser IP-2X. Um exemplo disso está no anexo B (normativo) da NBR5410 – “Meios de proteção básica (contra choques elétricos)”, transcrito abaixo:

B.2.2 As partes vivas devem ser confinadas no interior de
invólucros ou atrás de barreiras que garantam grau de proteção
no mínimo IPXXB*** ou IP2X.

*** NOTA: O grau de proteção IPXXB é equivalente ao grau de proteção IP2X e não deve ser confundido com IPXX.

 

Portanto, a primeira importante conclusão é que o grau de proteção mínimo de quadros de distribuição deve ser IP2X, definido deste forma com o objetivo de garantir a proteção contra choque elétrico. A partir desse grau, o projetista pode selecionar aquele mais lhe convém (leia-se menor custo), baseado obviamente na classificação das influências externas. Tipicamente, os quadros de distribuição para uso residencial, fabricados em material termoplástico, possuem grau de proteção IP40, ou seja, possuem proteção contra penetração de corpos sólidos com diâmetros maiores que 1mm e sem proteção contra penetração de água. Portanto, a escolha do local onde esse tipo de quadro será instalado deve ser feita com cautela. Já para os outros casos, para quadros de distribuição instalados nos mais diversos ambientes, não existe uma receita de bolo para a seleção do seu grau de proteção e este deve ser selecionado com base da classificação das influências externas.

 

CONCLUSÃO

Como apresentado no texto acima, a correta seleção do grau de proteção IP de um quadro de distribuição não é uma tarefa muito complexa, porém deve ser precedida de uma cuidadosa classificação das influências externas. Nesse sentido, ficou claro que usar IP54 (protegido contra poeira e projeção de água em qualquer direção) para qualquer quadro de distribuição pode ser um exagero em boa parte dos casos. Seria uma restrição bastante severa, que encarece consideravelmente o projeto e, além disso, expõe a falta de conhecimento ou inexperiência do projetista.

 

[5] ABNT NBR IEC 60529:2017 – Graus de proteção providos por invólucros (Códigos IP)

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